Destaque
Inteligência artificial alcança índice superior a 80% na identificação da Doença de Parkinson
A doença de Parkinson é conhecida por causar deficiências nas funções motoras, que se revelam em sintomas como tremores, movimentos lentos, dificuldades para caminhar e desequilíbrio. Mas a patologia também prejudica diversas funções não-motoras, ocasionando problemas para dormir ou ficar acordado, dores no corpo e distúrbios sensoriais. Segundo estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2019, mais de 8,5 milhões de pessoas sofriam com essa condição no mundo inteiro. E, de forma preocupante, as incapacidades funcionais e mortes devido à doença de Parkinson têm aumentado mais rapidamente do que as causadas por outras doenças neurológicas, segundo a própria OMS.
Apesar do alcance global da doença, não existem dados precisos sobre a quantidade de pessoas que sofrem dessa condição no Brasil. A falta de dados dificulta uma análise do seu real impacto.
Uma das prováveis causas para a falta de dados está na dificuldade de diagnóstico. Ainda hoje, o método mais comum consiste na avaliação clínica do paciente, por meio da análise dos sintomas que afetam sua habilidade motora, e pelo emprego de exames de ressonância magnética. Esta abordagem, porém, dificulta a distinção entre a doença de Parkinson e outras condições neurológicas degenerativas que gerem sintomas semelhantes, e muitas vezes resulta em erros de diagnóstico.
Segundo o Dr. Fabio Augusto Barbieri, professor e pesquisador do Departamento de Educação Física da Faculdade de Ciências da Unesp, campus de Bauru, e coordenador do Laboratório de Pesquisa em Movimento Humano (MOVI-LAB), a taxa de erro de diagnóstico é cerca de 15%, um número considerado alto para uma doença cada vez mais comum. “O índice de erro é alto porque envolve uma avaliação clínica. Ainda que os neurologistas usem critérios validados e sigam um check-list para estabelecer o diagnóstico, o processo envolve um componente subjetivo”, disse o professor Fabio Barbieri.
Além disso, nos casos em que o diagnóstico é positivo, os métodos atuais também são pouco precisos para identificar qual o estágio de desenvolvimento da doença de Parkinson. E isso se reflete na indicação do tratamento. “Se a ressonância não for direcionada para o ponto onde está ocorrendo a degeneração da doença, ela também vai apresentar um erro. Normalmente, acredita-se que o processo degenerativo causado pela doença de Parkinson aconteça nos gânglios da base, mas ele pode afetar outras regiões também”, explicou o pesquisador.
Pensando na necessidade de encontrar métodos mais precisos de diagnóstico e acompanhamento da condição, pesquisadores do mundo inteiro têm voltado sua atenção para a aplicação das técnicas de machine learning. Em agosto deste ano, o professor Barbieri foi um dos autores de artigo publicado na revista científica Gait and Posture. O objetivo do estudo foi testar diversas linguagens algorítmicas para identificar maior precisão no diagnóstico da doença de Parkinson e na identificação dos seus estágios. A pesquisa foi realizada com pesquisadores da Universidade do Porto, em Portugal, e alunos de pós-graduação do Programa de Ciências do Movimento que participam do MOVI-LAB, coordenado pelo professor Barbieri.
Sete anos de dados para avaliar
O diferencial do novo estudo está na observação de variáveis mais relacionadas ao chamado déficit da marcha, como a variabilidade do andar e a chamada assimetria. A variabilidade do andar diz respeito às diferenças na largura da passada. Já a assimetria está relacionada ao espalhamento da doença. Estima-se que, em 95% dos casos, o problema surge apenas em um dos lados do corpo, que começa então a apresentar os sintomas.
Os dados que embasaram o estudo foram coletados em um banco de dados do laboratório montado ao longo de sete anos com pesquisas realizadas com pacientes voluntários. Estas pessoas foram atendidas no projeto de extensão ‘Ativa Parkinson’, também coordenado pelo professor Barbieri. Para o estudo, foram agrupadas as variáveis de interesse dos diferentes estudos com o objetivo de conseguir uma amostra grande.
Foram analisadas 126 pessoas, tanto pacientes diagnosticados com Parkinson como indivíduos neurologicamente sadios. Estes formaram o grupo de controle. “Através do grupo controle podemos verificar o que se espera para aquela idade em termos do desempenho do andar, a chamada linha de base. Assim, podemos comparar os pacientes doentes com aqueles do grupo controle e verificar os efeitos, tanto da doença, quanto das intervenções”, disse o professor.
Outros dados medidos envolviam a largura, o comprimento, a duração, a velocidade e a cadência dos passos de cada indivíduo, além de informações como o tempo em que cada pessoa ficou com um pé no chão, e o tempo em que os indivíduos ficavam com ambos os pés no chão. As informações foram, então, aplicadas em dois modelos diferentes de machine learning: o primeiro voltado para o diagnóstico da doença de Parkinson e o segundo para a identificação do estágio da doença.
A partir desses dois modelos, foram analisados cinco algoritmos, intitulados Naïve Baise (NB), Support Vector Machine (SVM), Decision Tree (DT), Random Forest (RF), Logistic Regression (LR) e Multilayer Perceptron (MLP), que foram os mais empregados em testes semelhantes anteriores.
Cada algoritmo foi capaz de selecionar, entre os diversos parâmetros selecionados, quais podiam proporcionar uma análise mais precisa. O algoritmo Naïve Bayes selecionou apenas quatro informações: comprimento do passo, velocidade, largura e variação da largura do passo. Com esses dados, o algoritmo alcançou uma precisão de 84,6%, ao diagnosticar corretamente pessoas com a doença de Parkinson. Em comparação, o Random Forest escolheu doze informações, sendo o comprimento do passo, a variação de velocidade do passo e a velocidade do passo as mais importantes.
Já, ao identificar o estágio da doença, tanto o Naïve Bayes como o Random Forest se destacaram por apresentarem o maior AUC, que indica a capacidade de classificação da linguagem, e a maior precisão, respectivamente. As duas informações mais importantes para a análise do estágio da doença foram a variabilidade da largura do passo e a variação no tempo em que as pessoas ficavam com os dois pés no chão.
Apesar dos bons índices, o uso de machine learning não vai implicar o abandono das técnicas de análises clínicas. Ele é uma ferramenta a mais para aumentar a precisão dos diagnósticos e facilitar a definição de um tratamento adequado. Para além do diagnóstico, espera-se que os recursos digitais proporcionem novas compreensões sobre os mecanismos da doença, e ajudem na identificação de padrões de caminhada até então desconhecidos.
Acesse o resumo do artigo científico (em inglês).
Acesse a notícia completa na página do Jornal da Unesp.
Fonte: Malena Stariolo, Jornal da Unesp.
Os comentários constituem um espaço importante para a livre manifestação dos usuários, desde que cadastrados no Portal Tech4Health e que respeitem os Termos e Condições de Uso. Portanto, cada comentário é de responsabilidade exclusiva do usuário que o assina, não representando a opinião do Portal Tech4Health, que pode retirar, sem prévio aviso, comentários postados que não estejam de acordo com estas regras.
Apenas usuários cadastrados no Portal tech4health t4h podem comentar, Cadastre-se! Por favor, faça Login para comentar