Notícia

Técnicas cristalográficas e a possível cura da esquistossomose

Equipe da USP de São Carlos aplica técnicas de cristalografia para tentar eliminar a doença

Fonte

USP São Carlos

Data

quarta-feira, 10 setembro 2014 21:40

Áreas

Desenvolvimento de Fármacos.

A esquistossomose causa todos os anos milhares de mortes no mundo. Criado em 1975, o Praziquantel é o medicamento que tem sido usado para atuar na tentativa de cura da doença.  Mas melhor do que qualquer medicamento, o saneamento básico seria capaz de eliminar o Schistosoma mansoni, verme hematófago transmissor da doença. Porém, como a realidade nos mostra, essa ação está muito distante de ser concretizada efetivamente. Infelizmente, nem mesmo o Praziquantel foi efetivo na cura da doença, isso porque o fármaco não ataca os ovos nem as formas jovens do Schistosoma mansoni, impedindo sua eliminação definitiva do organismo. Uma segunda deficiência do medicamento foi relatada recentemente: o surgimento de casos de resistência ao Praziquantel por algumas cepas do verme no continente africano.

Alternativas de ataque ao verme

Diversos pesquisadores têm procurado por frentes alternativas – e obviamente mais eficazes – para eliminar a esquistossomose. A Dra. Ana Carolina Mafud, pesquisadora em estágio de pós-doutorado do Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da USP, supervisionada pela Profa. Dra. Yvonne Mascarenhas, é um deles.

No Grupo de Cristalografia, do qual faz parte, Ana Carolina pesquisa duas frentes de ataque à esquistossomose. A primeira refere-se à bioprospecção de produtos naturais, isto é, a busca por produtos naturais que tenham atividade contra a doença em questão. Nessa frente, três candidatos já apresentaram resultados satisfatórios: jaborandi, louro e uchi-amarelo. Tais resultados, inclusive, serão apresentados por Ana Carolina na edição de 2014 do Simpósio Brasileiro de Química Medicinal. “Nessa frente de pesquisa, conto com a colaboração do pesquisador Josué de Moraes, que tem toda sua formação acadêmica na USP e já passou pelo Butantã, Instituto Adolfo Lutz e, atualmente, é consultor de saúde pública na Câmara Legislativa do Estado de São Paulo, além de possuir um laboratório de pesquisa, o ‘Núcleo de Pesquisa em Doenças Negligenciadas’, na Faculdade de Ciências de Guarulhos (FACIG), o que facilita a realização de ensaios in vitro e in vivo”, conta Ana Carolina.

Tal facilidade estimulou Ana Carolina a realizar estudos numa segunda frente de ataque: o reposicionamento de fármacos, ou seja, pesquisar, em bancos de dados, moléculas já testadas e comercializadas contra qualquer doença e observar suas atividades no combate à esquistossomose. “Observamos, por exemplo, através de dados bibliográficos, que o Diclofenaco pode ajudar o organismo a não atacar o granuloma. Através de testes in vitro, confirmamos essa suposição e tivemos uma nova surpresa: o Schistosoma também é atacado, além do Diclofenaco agir sinergisticamente com o Praziquantel”, relembra a pesquisadora.

A cristalografia como protagonista

A descoberta acima, no entanto, gerou outra interrogação: como o Diclofenato e o Praziquantel, de classes químicas tão diferentes, podem atacar uma mesma doença? Partindo de estruturas cristalográficas e utilizando técnicas de bioinformática, Ana Carolina conseguiu resolver a dúvida: graças a uma região comum na composição eletrônica da estrutura dos dois fármacos*.

Outra técnica utilizada por Ana Carolina é o virtual screening, que consiste na sobreposição virtual das moléculas anotadas para encontrar candidatos que possuam estruturas moleculares similares ao Praziquantel. “No caso de nossa pesquisa, foram selecionadas moléculas que tenham similaridade, tanto do ponto de vista 2D, ou seja, a estrutura molecular simples, quanto 3D, que leva as distancias e ângulos interatomicos e o volume de van der Waals e potencial eletrostático em consideração. Uma vez encontradas, Josué realiza os testes para ver se a atividade, de fato, existe”, elucida Ana Carolina.

Em relação à bioprospecção de produtos naturais, Ana Carolina e os demais integrantes dessa pesquisa** utilizam outras técnicas para o desenvolvimento do estudo, entre elas a resolução da estrutura cristalina por difração de raios-X e análises térmicas de TG e DSC, além de outras técnicas adjacentes, como espectroscopia RAMAN. Ana Carolina, especificamente, faz também cálculos ab initio e semiempíricos de constantes físico-químicas. “Todos os dados que fornecemos auxiliam na elaboração dos ensaios in vitro e in vivo realizados por Josué”, conta.

O futuro da pesquisa

Embora animada com todos os resultados alcançados até o momento, Ana Carolina faz uma ressalva. “Entre a descoberta de produtos naturais com ação contra a esquistossomose e sua transformação em fármaco leva-se cerca de 15 anos. O Brasil, em toda sua história, nunca conseguiu produzir qualquer fármaco”, lamenta.

Outra barreira a ser vencida, também referente à bioprospecção, é a criação de uma técnica capaz de tornar solúveis os elementos de interesse de produtos naturais.

Porém, por sua baixa toxicidade e aceite no organismo- testes in vivo já realizados em ratos trouxeram resultados promissores-, os produtos naturais parecem, ainda, ser a melhor alternativa para produção de um fármaco contra a esquistossomose. E, mais do que isso, podem se mostrar úteis para cura de outras doenças negligenciadas.

*Este trabalho foi publicado pelo International Journal of Antimicrobials Agents, uma revista da International Society of Chemoterapy. Clique aqui para acessá-lo.

 **Atualmente, trabalham nas pesquisas mencionadas a também pós-doutoranda Lis S. Miotto e o aluno de graduação do Instituto de Química de São Carlos (IQSC/USP) Thiago Rubio.

Fonte: Assessoria de Comunicação, USP/São Carlos

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