Notícia
A biologia sintética e as mini fábricas biológicas
Pesquisadores da Unesp e da USP desenvolvem novas moléculas a partir da remodelação genética de microrganismos
Wikimedia Commons
Fonte
Unesp
Data
terça-feira, 23 maio 2017 14:00
Áreas
Biologia. Bioquímica. Microbiologia. Química Medicinal. Indústria Farmacêutica.
Há muito tempo, utiliza-se a levedura Saccharomyces cerevisiae para transformar açúcar em álcool e gás carbônico, processo este que se chama fermentação e possibilita a produção de biocombustíveis, bebidas alcoólicas e massas como pão e pizza.
O que vem se tornando uma realidade agora é a utilização deste mesmo microrganismo para a produção de moléculas químicas, não originárias da levedura e com alto valor agregado, como princípios ativos para a indústria farmacêutica e cosmética, por exemplo.
Saccharomyces cerevisiae observada no microscópio (Fonte: Wikimedia Commons)
Destaca-se, nos dias de hoje, a produção semi-sintética do antimalárico artemisinina, molécula originária da planta Artemisia annua, nativa de regiões temperadas da Ásia. A levedura não sintetiza naturalmente as enzimas para produção de artemisinina. Contudo, uma linhagem de S. cerevisiae foi modificada geneticamente para produzir uma alta quantidade do precursor desta enzima, o ácido artemisínico, para depois transformá-lo no princípio ativo usado na indústria farmacêutica. Outros compostos, como analgésicos similares à morfina (opioides), ou aromatizantes de cosméticos como santaleno também já foram produzidos em levedura, mas ainda não chegaram à produção industrial. Estes e outros avanços se baseiam nos princípios da Biologia Sintética que envolvem a transferência de conjuntos de genes de um ou mais organismos para outro em que tais vias de biossíntese são inexistentes.
A Biologia Sintética é uma subárea da ciência que possibilita a constante remodelação genética de microrganismos tornando-os pequenas fábricas biológicas e sustentáveis de moléculas com alto valor agregado. Portanto, constitui-se em uma alternativa para a obtenção de moléculas bioativas da biodiversidade brasileira em quantidades apreciáveis para sua utilização pela sociedade. Neste sentido, um dos projetos inserido no Programa CEPID/Fapesp – CIBFar, (Centro de Inovação em Biodiversidade e Fármacos, processo 13/07600-3), coordenado pelo Prof. Dr. Glaucius Oliva do Instituto de Física da USP/São Carlos, propõe o desenvolvimento de uma plataforma de Biologia Sintética para aumento da produção de terpenos ativos da biodiversidade utilizando linhagens de S. cerevisiae modificadas metabolicamente.
Nesse contexto, o Instituto de Química, representado pelo grupo de pesquisa da Profa. Dra. Maysa Furlan, a Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade Estadual Paulista (Unesp)-Campus de Araraquara pelo grupo liderado pelos professores Dr. Cleslei F. Zanelli e Dr. Sandro R. Valentini e o Instituto de Física da USP/São Carlos, pelo grupo do Prof. Dr. Rafael V. C. Guido, somaram esforços para alavancar os estudos de Biologia Sintética e colocaram como linha de frente os compostos produzidos por uma planta da nossa biodiversidade, a Maytenus ilicifolia ou, popularmente, “espinheira-santa”. O desenvolvimento das pesquisas contou com a participação de quatro pós-doutorandas com bolsas da Fapesp, além de alunos de doutorado, mestrado e iniciação científica, todos com bolsas da Fapesp, Capes e/ou CNPq.
Planta tradicionalmente utilizada na medicina popular, as folhas da espécie produzem princípios ativos utilizados para o tratamento de desordens gástricas.. Além de flavonoides, a atividade medicinal deve-se também ao triterpeno friedelina. O mesmo composto é também precursor de outros encontrados apenas nas raízes e com promissora atividade anticancerígena.
Os pesquisadores conseguiram copiar, a partir da planta, a sequência codificadora da enzima que sintetiza friedelina. Em seguida, esta foi transferida para o genoma de uma linhagem da levedura S. cerevisiae, o que possibilitou a produção da enzima (trabalho publicado em Scientific Reports, 2016 DOI: 10.1038/srep36858). Os achados tornam esta produção mais eficiente, padronizada e independente de variações ambientais.
Atualmente, o grupo de pesquisa vem trabalhando na modificação desta linhagem de levedura para ultrapassar os níveis de produção de friedelina observados na planta, bem como na identificação das enzimas que produzem os derivados com potencial atividade antitumoral.
As ferramentas de Biologia Sintética têm trazido soluções, inovações e benefícios, como o aumento da produtividade de moléculas in vivo, explorando a biodiversidade da flora de forma sustentável. Desta forma, a Unesp e a USP contribuem para alavancar a Biologia Sintética no Brasil, visando solucionar problemas e/ou atender a diferentes necessidades da sociedade nos campos da saúde, agricultura e produção de energia.
Fonte: Assessoria de Comunicação e Imprensa, Unesp. Imagem: Wikimedia Commons.
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