Notícia

As implicações da gravidez não planejada de adolescentes no Brasil

Ginecologista analisa o cenário e discute a importância do planejamento reprodutivo voluntário

Divulgação

Fonte

FEBRASGO

Data

quinta-feira, 19 novembro 2015 15:00

Áreas

Ginecologia e Obstetrícia. Políticas Públicas.

A Dra. Marta Finotti, ginecologista e presidente da Comissão Nacional Especializada em Anticoncepção da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO) publicou este mês no site da Federação um artigo sobre as implicações da gravidez não planejada no Brasil. O estudo, que analisa com profundidade aspectos sociais e de acesso a métodos de contracepção, destaca a importância do planejamento reprodutivo voluntário como um dos maiores avanços em saúde pública alcançados no último século.

Leia a íntegra:

“Uma gravidez não planejada pode ter consequências negativas, principalmente quando acontece na adolescência. Ao engravidar, uma jovem pode ter o seu presente e futuro totalmente alterados. As perspectivas de continuar sua educação diminuem e as oportunidades de ter um emprego também reduzem, fortalecendo assim um ciclo de pobreza, desigualdade e exclusão.

A gravidez entre adolescentes no Brasil é alta e tem repercussões econômicas relevantes para a sociedade, para as jovens e suas famílias. Segundo o DATASUS, 600 mil partos no país (21,5% do total), são de mães com menos de 20 anos, 75% das adolescentes que têm filhos não estudam e 57,8% não estudam nem trabalham1, 2. Pesquisa do Banco Mundial mostra que cada ano adicional de ensino secundário de uma menina aumenta sua renda potencial futura entre 15% e 25%3.

Os filhos de mães adolescentes apresentam maior vulnerabilidade social, já que estatisticamente correm mais risco de abandono, violência doméstica e baixo acesso à saúde e à educação4, 5. Para complicar a situação, a reincidência de gestações é frequente. Aproximadamente 30% das adolescentes engravidam no primeiro ano pós-parto, e entre 25% e 50%, no segundo ano pós-parto6, tornando ainda mais difícil a reintegração da mãe à escola e ao mercado de trabalho.

As implicações em saúde são diretas para mães e filhos. Adolescentes têm maior risco de complicações e mortalidade, sendo o parto a principal causa de morte de mulheres jovens entre 15 e 19 anos em países em desenvolvimento7. A incidência de mortalidade infantil é, em média, quatro vezes maior, quando comparada à de mães com idade acima de 20 anos8.

O abortamento inseguro representa também um grave risco e alto custo para o sistema público, sendo frequentemente usado na falha ou no uso incorreto de contraceptivos, conforme revelam dados do Ministério da Saúde9. Para se ter uma ideia, a curetagem pós-abortamento é o segundo procedimento obstétrico mais realizado nos serviços públicos de saúde no Brasil. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, 31% das gestações no país terminam em aborto10 e são registradas cerca de 230 mil internações, por ano, para tratamento das complicações decorrentes do aborto11.

Adolescentes são consideradas um grupo vulnerável quando o assunto é gestação não planejada. Um levantamento feito com cerca de 24 mil grávidas em todo o Brasil revelou que, entre as adolescentes, dois terços não desejavam a gravidez e 3,4% disseram ter tentando interromper a gestação12. Menor conhecimento sobre o corpo e fertilidade, sensação de poder e o pensamento mágico de que “comigo não vai acontecer”, relacionamentos não estáveis, vergonha ou falta de coragem de negociar a prevenção, são alguns dos fatores que podem ajudar a explicar a falta de adesão aos métodos contraceptivos. Estudo realizado com adolescentes universitárias de São Paulo mostrou que 54,3% se esquecem de tomar mais de três, pílulas durante o mês13. E aproximadamente 20% das que usam pílula contraceptiva engravidam ao final do primeiro ano de uso14.

Existem atualmente métodos de contracepção que oferecem proteção eficaz contra a gravidez não planejada por não dependerem da interferência direta e disciplina da usuária, o que facilita a adesão. Chamados métodos reversíveis de longa duração (do inglês LARC, Long-Acting Reversible Contraception), podem melhorar a efetividade da contracepção, principalmente nesse público específico15, 16.  Os LARCs podem ser usados em nuligestas e serem interrompidos a qualquer momento, caso haja o desejo de engravidar17. A Organização Mundial da Saúde (OMS) inclui em sua lista básica de sugestão para sistemas públicos de saúde a disponibilização de métodos contraceptivos de longa ação17.

Atualmente, o Brasil deixa de acrescentar US$ 3,5 bilhões de dólares à sua riqueza nacional (PIB) por ano devido à gravidez de adolescentes18. Um trabalho do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) de 2013 mostra que o planejamento reprodutivo voluntário é um dos investimentos mais custo-efetivos que um país pode fazer em seu futuro. Cada dólar gasto em planejamento familiar pode economizar até 6 dólares dos governos, possibilitando que estes invistam mais em atenção básica e outros serviços de saúde19.

O planejamento reprodutivo voluntário foi um dos maiores avanços em saúde pública alcançados no último século. Ele permite que as mulheres tomem decisões informadas sobre se e quando querem ter filhos, reduzindo a mortalidade materna e infantil, além de diminuir as taxas de gestações não planejadas e abortos inseguros, e aumentar as oportunidades para as mulheres, resultando em famílias e comunidades mais saudáveis e prósperas19.”

Seminário discute informação e conscientização

A Fundação Poder Jovem promove, no dia 26 de novembro, o Seminário “Informação e conscientização: fortalecendo lideranças pela educação”, com o intuito de discutir conflitos ligados à adolescência e fomentar a prevenção de problemas de forte impacto nesta faixa etária, como gravidez, doenças sexualmente transmissíveis e abordagem da sexualidade. O público alvo do Seminário são diretores de escolas e coordenadores pedagógicos.

O seminário acontece entre as 08h00 e 17h30, no auditório da Universidade Paulista (UNIP), no Jaguaré, em São Paulo (SP). Mais informações pelo e-mail: g.brunetti@terra.com.br.

 

Referências:

1. Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC), 2011. Abrange todos os nascimentos no Brasil e não somente os que aconteceram no SUS. Acessado em 08/10/2015. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/sinasc/Consolida_Sinasc_2011.pdf

2. Castro, Jorge Abrahão de Organizador; Aquino, Luseni Organizador. Juventude e políticas sociais no Brasil. 2008.

3. Psacharopoulous, G. et al. “Returns to Investment in Education: A further Update”. Policy Research Working Paper 2881 (Washington, DC: World Bank 2002). Acessado em 08/10/2015. Disponível em: http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=600769

4. Russo, Nancy Felipe; David, Henry P. When pregnancies are unwanted. Opinion, comment, 2002.

5. Portal da Saúde. Rede Cegonha. Acessado em 08/10/2015. Disponível em:http://dab.saude.gov.br/portaldab/ape_redecegonha.php

6. Pfitzner, Mark A.; Hoff, Charles; Mcelligott, Kathleen. Predictors of repeat pregnancy in a program for pregnant teens. Journal of Pediatric and Adolescent Gynecology, v. 16, n. 2, p. 77-81, 2003.

7. Because I am a Girl. The State of the World’s Girls 2009. Girls in the Global Economy: Adding It All Up, p.51. London, Plan. World Health Organization WHO, Women and Health. Acessado em 08/10/2015. Disponível em: https://plan-international.org/state-worlds-girls-2009-girls-global-economy

8. Simões, Vanda Maria Ferreira et al. Características da gravidez na adolescência em São Luís, Maranhão. Rev Saúde Pública, v. 37, n. 5, p. 559-65, 2003.

9. Fusco, Carmen LB et al. Unsafe abortion: social determinants and health inequities in a vulnerable population in São Paulo, Brazil. Cadernos de Saúde Pública, v. 28, n. 4, p. 709-719, 2012.

10. Domingos, Selisvane Ribeiro da Fonseca; Merigui, Miriam Aparecida Barbosa. O aborto como causa de mortalidade materna: um pensar para o cuidado de enfermagem. Esc Anna Nery, v. 14, n. 1, p. 177-81, 2010.

11. Gali MB., Viana APAL. O impacto da ilegalidade do aborto na saúde das mulheres e nos serviços de saúde em cinco estados brasileiros: subsídios para o debate político. Fazendo Gênero 9. Diáspora, Diversidades. Acessado em 08/10/2015. Disponível em: http://www.fazendogenero.ufsc.br/9/resources/anais/1278297541_ARQUIVO_OimpactodailegalidadedoabortoBrasilFG10FINAL.pdf

12. Pesquisa “Nascer no Brasil – Inquérito Nacional sobre Parto e Nascimento”, Fiocruz. Acessado em 08/10/2015. Disponível em: www.ensp.fiocruz.br/portal-ensp/informe/site/arquivos/anexos/nascerweb.pdf

13. Alves, Aline Salheb; Lopes, Maria Helena Baena de Moraes. Conhecimento, atitude e prática do uso de pílula e preservativo entre adolescentes universitários. Rev. Bras. Enferm, v. 61, n. 1, p. 11-17, 2008.

14. Cristina AP F, Guazzelli et al. Etonogestrel implant in postpartum adolescents: bleeding pattern, efficacy and discontinuation rate. Contraception, v. 82, n. 3, p. 256-259, 2010.

15. Duarte, Camila de Fátima; Holanda, Luana Brito; Medeiros, Michelle Loiola de. Avaliação de conhecimento contraceptivo entre adolescentes grávidas em uma unidade básica de saúde do Distrito Federal. J. Health Sci. Inst, v. 30, n. 2, 2012.

16. Vieira, Leila Maria et al. Considerations on contraceptive methods used by adolescents in Brazil. Revista Brasileira de Saúde Materno Infantil, v. 6, n. 1, p. 135-140, 2006.

17. Report of the 20th WHO Expert Committee on the Selection and Use of Essential Medicines. Acessado em 08/10/2015. Disponível em: http://www.who.int/medicines/publications/essentialmedicines/Executive-Summary_EML-2015_7-May-15.pdf?ua=1

18. Estudo “Situação da População Mundial 2013″, com tema “Maternidade Precoce: enfrentando o desafio da gravidez na adolescência”. Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), outubro de 2013. Acessado em 08/10/2015. Disponível em: http://www.unfpa.org.br/Arquivos/SWOP%202013%20-%20Summary%20Portugues.pdf

19. Bill & Melinda Gates Foundation. Acessado em 08/10/2015. Disponível em: http://www.gatesfoundation.org/What-We-Do/Global-Development/Family-Planning

 

Fonte: FEBRASGO. Imagem: Divulgação.

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