Notícia
Proteína inovadora pode fazer a redução de tumores
Pesquisa em parceria entre Instituto Butantan, IPT e indústria farmacêutica identifica proteína recombinante que reduz tumores em animais

Divulgação, IPT
Um grupo de pesquisadores do Instituto Butantan com tradição em pesquisas de hematófagos (animais que se alimentam de sangue), e interessados em encontrar novas entidades com ação no sistema hemostático, estudaram a saliva e a glândula salivar do carrapato estrela (Amblyomma cajennense) sob a coordenação da pesquisadora Dra. Ana Marisa Chudzinski-Tavassi.
O intuito era saber quais moléculas estavam envolvidas no impedimento da coagulação do sangue do hospedeiro, durante o processo de alimentação dos carrapatos, e com isso conhecer novas moléculas com potencial para serem desenvolvidas como agentes anticoagulantes ou anti-hemostáticos. A equipe descobriu nestes estudos componentes com atividade inibitória do fator X ativado da coagulação sanguínea. A inibição deste fator de coagulação é chave no processo de anticoagulação, visto que a geração da proteína trombina é regulada por ele.
Devido à escassez de amostras para trabalhar por conta do tamanho diminuto do carrapato, decidiu-se por avaliar os genes que compõem a glândula salivar do animal, com a ajuda de uma análise transcriptômica. Os pesquisadores chegaram a cerca de dois mil transcritos, e destes elegeram um gene que seria responsável pela tradução de proteínas pertencentes à família de inibidores de serino proteases do tipo Kunitz, cujos diversos membros estão citados na literatura como inibidores do fator X ativado.
Selecionado o gene, os pesquisadores obtiveram uma proteína na forma recombinante, utilizando bactérias, a qual foi purificada e avaliada no sistema de coagulação, demonstrando o funcionamento como anticoagulante. “Como a ideia era desenvolver um anticoagulante, nada mais lógico a avaliação em culturas de células que compõem os vasos sanguíneos, para saber se o tratamento com a proteína expressa poderia induzir a alguma modificação ou alguma toxicidade. Fizemos os testes preconizados e não vimos nenhum efeito, pelo menos macroscópico, nas células normais” explica a Dra. Ana Marisa.
O próximo passo foi avaliar a atuação da proteína em células tumorais. Para surpresa dos pesquisadores, em todas as culturas trabalhadas de diferentes tipos de tumores, a proteína causou morte das células. “Encontramos então uma molécula que inibia a coagulação, mas também matava seletivamente células tumorais”, acrescenta ela.
Pesquisa aplicada
Uma nova fase de pesquisa aplicada teve início utilizando conceitos de qualidade e seguindo as normas de agências regulatórias que preconizam a rastreabilidade e a reprodutibilidade, possíveis de serem implantadas no projeto, visto a nova estrutura idealizada pela coordenadora do projeto e implantada no Instituto Butantan, denominada Plataforma de Desenvolvimento e Inovação, instalada para trabalhar utilizando boas práticas de laboratório.
Os pesquisadores estudaram mais a fundo nessa plataforma os mecanismos de ação da molécula e também realizaram testes de eficácia, verificando que o tratamento com a proteína induzia a diminuição de tumores como melanomas, de pâncreas e renal. Decidiu-se pela otimização das construções gênicas e a avaliação dos melhores clones produtores e por um processo de expressão que fosse escalonável, já pensando na produção em grandes quantidades.
“Chegamos então ao momento da realização dos testes de segurança, os testes pré-clínicos, e para tanto uma grande quantidade de proteína era necessária. Em uma tentativa de se ganhar tempo, contratou-se uma empresa de biotecnologia americana para produzir os lotes, adaptando-se à tecnologia desenvolvida até então pelo grupo de pesquisadores”, explica Ana Marisa. “O material produzido foi suficiente para a realização de testes de segurança em roedores. Sabíamos que necessitaríamos de grandes quantidades da molécula para testes em animais de maior porte, e então buscamos parceria com o Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT) para esta etapa, pois sabíamos que o Instituto possuía bioreatores para vários volumes e equipe competente que poderia realizar os estudos de escalonamento”.
Pesquisadores do Núcleo de Bionanomanufatura do IPT foram contatados e alguns cultivos em bioreatores foram realizadas com sucesso. Com um financiamento (BNDES Funtec) de R$ 15 milhões, foi criada uma dinâmica para o projeto: o IPT faria o bioprocesso e escalonamento, e o Instituto Butantan toda a etapa de purificação e testes.
A Dra. Maria Filomena de Andrade Rodrigues, pesquisadora do IPT, afirma que o trabalho realizado no instituto consiste em dar condições para o crescimento da bactéria no meio de cultivo apropriado e identificar a melhor condição, buscando alta produtividade, baixo custo e alto rendimento. “Estamos testando diferentes condições de operação do processo para obtermos uma alta densidade celular e, a partir dela, isolar altas concentrações da proteína”, afirma a pesquisadora.
Testes em Humanos
Todo o processo de pesquisa realizado até aqui serve de base para desenhar o ensaio clínico, isto é, testes em humanos. Esta parte do processo é de responsabilidade da indústria farmacêutica, no caso a União Química, que compartilha do projeto desde o início e é detentora da licença da patente. Após a realização de testes com animais, o desejo de Ana Marisa é a indicação de estudos de fase dois em seres humanos.
“Pelos resultados vistos em animais saudáveis, verificamos que o nível de toxicidade da molécula é muito baixo. Como temos resultados animadores de regressão de tumores de difícil tratamento, como é o caso do pâncreas, gostaríamos de avançar rapidamente nos ensaios clínicos”, afirma ela. No entanto, para a continuidade do desenvolvimento, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) precisará analisar todo o trabalho feito até aqui pelos pesquisadores e também o desenho dos testes clínicos que serão propostos pela União Química.
A proteína analisada pelos pesquisadores do Instituto Butantan é estudada exclusivamente no Brasil, e Ana Marisa ressalta que não é correto afirmar que o estudo é sobre a ‘proteína da saliva do carrapato’: “O carrapato foi um importante meio para podermos chegar à proteína recombinante”. É importante deixar ainda claro, ressalta ela, que não é possível afirmar que foi descoberta a cura para o câncer: “É correto dizer que, em camundongos, foi analisada a regressão dos tumores que chega até a sua eliminação, mas se trata ainda de uma etapa em animais”.
Fonte: IPT. Imagem: Divulgação, IPT.
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