Notícia

Ver para crer? Como as ondas cerebrais afetam nossa experiência consciente

Grupo de pesquisa da Universidade de Bolonha obteve a primeira evidência causal da dupla dissociação entre o que vemos e o que pensamos que vemos: os dois mecanismos dependem da frequência e amplitude das ondas cerebrais alfa

geralt via Pixabay

Fonte

Universidade de Bolonha

Data

quarta-feira, 2 fevereiro 2022 06:55

Áreas

Neurociências. Neurologia. Psicologia. Psiquiatria.

“Ver para crer”, dizemos quando queremos ter certeza de algo. Mas o que vemos e o que pensamos que vemos são realmente a mesma coisa? Um novo estudo publicado na revista científica Current Biology mostra que esse não é o caso: a percepção objetiva da informação visual e sua interpretação subjetiva – embora geralmente fortemente conectadas – são mecanismos neurais distintos que podem ser manipulados independentemente um do outro.

Liderada por estudiosos da Universidade de Bolonha, na Itália, em colaboração com o Instituto AUSL Bolonha e a Universidade de Glasgow, no Reino Unido, a pesquisa mostrou pela primeira vez que os dois mecanismos em questão dependem em particular da frequência e da amplitude das ondas cerebrais alfa: ondas cerebrais penetrantes do córtex visual posterior e ligadas à atenção e à concentração. O resultado é a primeira evidência causal da dupla dissociação entre o que vemos e o que pensamos que vemos: uma descoberta que pode ser útil para desenvolver novos tratamentos para pacientes neurológicos e psiquiátricos com comprometimento da consciência.

“Várias alterações da consciência, como fabulações e falsas memórias, podem ser explicadas por uma integração reduzida entre componentes subjetivos e objetivos da experiência, e da mesma forma a dissociação entre representação interna e realidade externa que é observada em pacientes esquizofrênicos poderia encontrar sua raiz na falta de comunicação entre esses processos básicos”, explicou o Dr. Vincenzo Romei, professor do Departamento de Psicologia da Universidade de Bolonha e coordenador do estudo. “Ao identificar os marcadores desses dois processos nas oscilações das ondas cerebrais alfa, nosso estudo representa um passo importante para entender as alterações de consciência em pacientes neurológicos e psiquiátricos e, portanto, desenvolver novos tratamentos de precisão que possam aumentar a integração desses processos”.

Existem, de fato, vários exemplos de dissociação entre eventos percebidos pelos sentidos e sua interpretação subjetiva. Clinicamente, por exemplo, em casos de esquizofrenia, mas também pode acontecer na vida cotidiana, com falsas memórias. A questão fundamental da qual os pesquisadores partiram é então se esses dois aspectos podem ser isolados independentemente um do outro e de qual elemento da atividade cerebral eles dependem.

Para descobrir, os cientistas realizaram uma série de experimentos em uma amostra de 92 pessoas. Os participantes foram submetidos a uma tarefa de atenção visual enquanto suas oscilações de ondas cerebrais foram registradas usando eletroencefalografia de alta densidade (EEG).

Desta forma foi possível isolar os dois processos-chave que ocorrem quando observamos algo: um mais ‘objetivo’, ligado à precisão da observação, e outro mais ‘subjetivo’, ligado à representação interna da experiência visual, ou seja, ao nível de segurança do reconhecimento do que foi visto.

Os cientistas observaram em particular que o primeiro processo – aquele ligado à amostragem ‘objetiva’ do mundo externo – está ligado à velocidade das oscilações cerebrais alfa. Quanto mais rápidas fossem essas oscilações, mais os participantes do experimento responderam com precisão.

“As oscilações na banda alfa há muito são consideradas índices relevantes da percepção humana”, disse o Dr. Francesco Di Gregorio, psicólogo pesquisador da AUSL Bologna, e coautor da pesquisa. “Esses resultados mostram que a percepção não é um fenômeno contínuo, mas discreto: cada ciclo de ondas alfa representa um ciclo de amostragem de informações sensoriais; portanto, quanto mais rápida a oscilação, mais informações podem ser acumuladas, aumentando a precisão”.

Comparado ao segundo processo envolvido – aquele ligado à representação ‘subjetiva’ do mundo externo – é a amplitude das oscilações alfa do cérebro que faz a diferença. Durante o experimento, quanto maior a força do sinal, menor o nível de confiança subjetiva com que os participantes responderam.

“A amplitude das oscilações alfa tem sido frequentemente associada a processos do tipo inibitório”, explicou Jelena Trajkovic, estudante de doutorado na Universidade de Bolonha, e coautora do estudo. “A partir dos dados coletados, emergiu que esse processo inibitório, em particular, está ligado à nossa experiência subjetiva e não à nossa capacidade objetiva de sermos precisos.”

Para confirmar o papel desses dois elementos – a velocidade, por um lado, e a amplitude, por outro, das ondas alfa – na influência dos fenômenos perceptivos, os pesquisadores realizaram um segundo experimento, usando a Estimulação Magnética Transcraniana : uma técnica graças à qual é possível manipular diretamente as oscilações cerebrais. Aumentando ou diminuindo independentemente primeiro a velocidade das oscilações alfa, depois sua amplitude, foi possível demonstrar que essas mudanças realmente correspondem a modulações da precisão ou grau de confiança com que uma pessoa percebe uma imagem.

“É importante sublinhar que os aspectos objetivos e subjetivos da percepção são, em qualquer caso, altamente integrados: a amplitude das oscilações alfa é modulada ainda mais após a apresentação do estímulo visual, integrando e atualizando nossas expectativas com as informações recebidas. Neste estudo demonstramos que a capacidade de perceber com precisão (transmitida pela velocidade das oscilações alfa) interage com a confiança na resposta (transmitida pela amplitude das oscilações): desta forma, nossa representação subjetiva é continuamente atualizada a fim de refletir melhor nosso desempenho objetivo”, concluiu o Dr. Vincenzo Romei.

Acesse o artigo científico completo (em inglês).

Acesse a notícia completa na página da Unibo Magazine, Universidade de Bolonha (em italiano).

Fonte: Universidade de Bolonha. Imagem: geralt via Pixabay.

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