Notícia

Nova tecnologia permite que amputados possam sentir as pernas protéticas

A prótese biônica, desenvolvida por uma equipe internacional de pesquisadores, possui sensores que se conectam aos nervos residuais na coxa

Reprodução, ETHZ

Fonte

ETHZ | Instituto Federal de Tecnologia de Zurique

Data

quinta-feira, 12 setembro 2019 09:00

Áreas

Biomecânica. Bioeletrônica. Engenharia Biomédica. Medicina. Neurociências.

Dois voluntários são os primeiros amputados acima do joelho no mundo a sentir seus pés e joelhos protéticos em tempo real. A prótese biônica, desenvolvida por uma equipe internacional de pesquisadores, possui sensores que se conectam aos nervos residuais na coxa. O neurofeedback resultante reduz bastante a tensão física e mental dos usuários da prótese.

Ao caminhar, as pessoas com pernas intactas sentem quando movem o joelho ou quando os pés tocam o chão. O sistema nervoso constantemente utiliza feedback sensorial desse tipo para controlar com precisão os músculos. As pessoas que usam uma prótese de perna, no entanto, não sabem exatamente onde a prótese está localizada, como está se movendo ou em que tipo de terreno está pisando. Frequentemente, eles não podem confiar completamente na prótese ao caminhar, levando-os a confiar demais na perna intacta, o que, por sua vez, reduz a mobilidade e faz com que se cansem rapidamente. Uma simples caminhada na  areia, por exemplo, pode ser muito desgastante para as pessoas que usam uma prótese. Além disso, pessoas com amputações podem experimentar dor fantasma nos membros, uma condição que os medicamentos existentes geralmente não conseguem tratar. Savo Panic, que experimenta esse fenômeno, diz que acorda à noite devido à dor fantasma: “O dedo do pé que não tenho dói. Pé, calcanhar, tornozelo, panturrilha – todos machucam e eu nem os tenho. ”

Uma equipe internacional de pesquisadores liderada pelo Instituto Federal de Tecnologia de Zurique (ETHZ, da sigla em alemão) e a empresa SensArs, com sede em Lausanne, ambos na Suíça, desenvolveu uma interface para conectar uma prótese de perna aos nervos residuais presentes na coxa do usuário, fornecendo feedback sensorial. Em um estudo realizado em colaboração com a Universidade de Belgrado, os cientistas testaram esse sistema de neurofeedback com dois voluntários que têm uma amputação de perna acima do joelho e usam uma prótese de perna.

A solução beneficia amputados de várias maneiras, conforme relataram os pesquisadores na última edição da revista científica Nature Medicine. “Este estudo de prova de conceito mostra como é benéfico para a saúde dos amputados de perna possuir uma prótese que trabalhe com implantes neurais para restaurar o feedback sensorial”, diz o professor Dr. Stanisa Raspopovic, do Instituto de Robótica e Sistemas Inteligentes da ETHZ.

Transformando sinais artificiais em sinais naturais

Para fornecer ao sistema nervoso informações sensoriais, os cientistas começaram com uma prótese de alta tecnologia disponível comercialmente: eles conectaram sensores táteis à sola do pé protético e coletaram os dados sobre o movimento do joelho fornecidos pela articulação eletrônica do joelho da prótese.

Nos três meses em que o experimento durou, os cirurgiões colocaram pequenos eletrodos na coxa de cada voluntário e os conectaram aos nervos residuais da perna. “O objetivo da cirurgia era introduzir eletrodos nos lugares certos dentro do nervo para permitir a restauração de realimentação sensorial realista e a estabilidade dos eletrodos”, explicou o Dr. Marko Bumbasirevic, professor e microcirurgião ortopédico no Centro Clínico da Sérvia em Belgrado, que foi o clínico responsável pelo implante de eletrodo. Os eletrodos foram desenvolvidos por cientistas da Universidade de Freiburg e a prótese veio da empresa protética Össur; ambos estavam envolvidos ativamente no projeto.

A equipe de pesquisa desenvolveu algoritmos para traduzir as informações dos sensores táteis e de movimento em impulsos de corrente – a linguagem do sistema nervoso – que foram entregues ao nervo residual. Então a natureza faz o resto: os sinais dos nervos residuais são transmitidos ao cérebro da pessoa, que é capaz de detectar a prótese e ajuda o usuário a ajustar sua marcha de acordo. A máquina e o corpo ficam finalmente conectados.

Assista ao vídeo de apresentação da pesquisa:

Menos esforço durante a caminhada

Como parte do estudo, os voluntários foram submetidos a uma série de testes – alternando ensaios com e sem neurofeedback. Os resultados deixaram bem claro o quão vantajoso foi o feedback: caminhar com neurofeedback foi fisicamente muito menos exigente, como mostra a redução significativa no consumo de oxigênio dos voluntários durante a caminhada.

Também mentalmente, a deambulação com neurofeedback foi menos extenuante, como os pesquisadores mostraram com medidas de atividade cerebral durante os ensaios. Os voluntários não precisavam se concentrar tanto na marcha, o que significava que podiam dedicar mais atenção a outras tarefas.

Em um teste difícil, os voluntários tiveram que caminhar sobre a areia e, novamente, o feedback lhes permitiu caminhar consideravelmente mais rápido. Nas pesquisas, os voluntários afirmaram que o neurofeedback aumentou bastante sua confiança na prótese.

Dor reduzida no membro fantasma

A interface com o sistema nervoso também pode ser usada para estimular os nervos independentemente da prótese. Antes de iniciar o julgamento, os dois voluntários se queixaram de dor nos membros fantasmas. Ao longo de um programa de terapia de um mês com neuroestimulação, os cientistas conseguiram reduzir consideravelmente essa dor em um dos voluntários; no outro, a dor desapareceu completamente. “Desde que iniciei este programa de tratamento, depois de receber estímulos elétricos, não senti nenhuma dor fantasma”, diz um dos voluntários.

Os cientistas veem esses resultados de maneira otimista. No entanto, eles apontam a necessidade de uma pesquisa mais longa com avaliações em casa e um maior número de voluntários, a fim de fornecer dados mais robustos que eles possam usar para tirar conclusões mais significativas. Para o estudo clínico por tempo limitado, os sinais da prótese foram enviados ao longo dos cabos através da pele para os eletrodos na coxa. Isso significou que os voluntários precisaram passar por exames médicos regulares. Para eliminar essa necessidade, os cientistas pretendem desenvolver um sistema totalmente implantável. “Na SensArs, planejamos desenvolver um dispositivo de neuroestimulação sem fio que possa ser totalmente implantado no paciente como um marcapasso e que possa ser trazido ao mercado”, diz Francesco Petrini, CEO da SensArs.

Acesse o resumo do artigo científico (em inglês).

Acesse a notícia na página do ETHZ (em ingês).

Fonte: Instituto Federal de Tecnologia de Zurique. Imagem: Reprodução, ETHZ.

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